11 abril 2018

Valmar Oliveira, um artista múltiplo


Desde muito cedo, Valmar Oliveira vivia cercado por elementos que o acompanham até hoje, como música, filmes, seriados e quadrinhos. Antes mesmo de ler, já rabiscava nos livros da casa. Influenciado por seu pai, consumia avidamente as revistas que lhe eram dadas, em especial os quadrinhos de heróis. No meio dos anos 80 tomou contato com o quadrinho underground europeu e nacional, o que abriu novos horizontes para um novo tipo de linguagem, passando a explorar novas técnicas. No final dos anos 80 participou da AQB (Associação de Quadrinistas da Bahia), grupo de fanzineiros que se reuniam para troca de idéias e experiências. Participou de fanzines, publicando quadrinhos, tiras, ilustrações oi fazendo resenhas, inclusive de música. Publicou quadrinhos na revista Crau, da extinta Impression, quadrinhos eróticos pela 2M (Brazil e HQ Brazil), e no núcleo de pesquisa da UFBA (Universidade Federal da Bahia), onde se formou como Bacharel em Artes Plásticas. Participou de vários salões de humor nacionais e internacionais (como a 4th Cartoons Undercover na Belgica e o XXX Salão de Piracicaba, SP), trabalhou como free lancer para algumas agências publicitárias em Salvador como ilustrador.

Atualmente trabalha como educador, além de produzir ilustrações ocasionais. Faz parte da HQ Bahia, nova associação de quadrinistas. Publicou HQs pela Editora Júpitor II (antiga SM) nas revistas Boca do Inferno e Raio Negro, após um período afastado dos quadrinhos. Artista plástico. Arte Educador. Ilustrador. Quadrinista. Artista múltiplo ele vai de quadrinhos, música, cinema e artes plásticas. O Blog do Gutemberg conversou com ele sobre sua trajetória.



Você é professor, músico, videomaker, quadrinista, um artista múltiplo. O que levou a fazer quadrinhos ?

VO - Os quadrinhos fazem parte da minha formação como pessoa. Praticamente eu comecei a me interessar por HQs por conta de meus pais que me davam pra ler e passar o tempo, e ai comecei a rabiscar já com 5 anos. Então, minha formação, e o que me levou a fazer HQs é meu amor por essa expressão artística maravilhosa, aliada a meu gosto por filmes e seriados.

Como foi seu começo?

VO - Comecei rabiscando os livros de enfermagem de minha mãe, páginas em brancos de livros e enciclopédias. Depois passei a rabiscar cadernos e folhas de oficio. Ai passei a criar meus heróis, alguns eram cópias ou variações de heróis já existentes. Cheguei a ter quase 200 personagens. Pegava as folhas de oficio e dobrava, colava no meio e fazia meus formatinhos. Desenhava à caneta, pintava com lápis de cor. Por conta disso, tenho facilidade em criar, sem precisar de esboços, já eu pensava na cena toda na cabeça e já desenhava direto no papel usando bic de tinta azul, e posteriormente a de cor preta. Muito tempo depois me disseram que as artistas usavam nanquim e fui usar pena mosquito e foi quando passei a desenhar primeiro a lápis para depois fazer a arte final. Ai já passei para tentar fazer fanzines e projetos diferentes.


Quando estudava na Escola de Belas Artes da UFBA teve contato com outros colegas que fazem quadrinhos. E o professor Juarez Paraíso, apaixonado pelos quadrinhos...

VO - Tive contato com pouca gente que fazia. A maioria apenas lia. Cheguei a participar de uma publicação, um zine offset onde tinha material do Fernando Lopes e Naara Nako.

Quando foi publicada sua primeira HQ?

VO - De forma profissional, foi a Crau # 1 (Editora Impression, 1995). Antes eu fazia minhas próprias HQs e fanzines. Posteriormente passei a fazer quadrinhos eróticos para editora paulista e participar de coletâneas.

Você também faz caricaturas, charges e cartuns?
VO - Caricaturas não faço, pois as que fiz achei ruins e parei. Charges e cartuns já faço, embora não tenha feito mais nada nesse sentido. Antes eu fazia mais para salões.

Quais são suas maiores influências?
VO - Minha maiores influencias são Jack Kirby, Frank Miller, Bené Nascimento, Jim Starlin, Mike Mignola, Brian Bolland, Tanino Liberatore, Dali, Caravaggio, Bob Larkin, Earl Norem, Dave Mckean, Simon Bisley, Sal e John Buscema, Frank Frazetta...

Qual a informação que alimenta o seu trabalho?

VO - Bem, eu pessoalmente me inspiro em filmes de terror e ficção científica. Procuro não me influenciar pelas HQs que leio.


Você fez uma HQ, A Conquista do Brasil em 2000. Fale um pouco desse trabalho?

VO - Essa HQ foi feita para uma exposição sobre os 500 anos do Brasil. Teve maior polêmica, pois tudo era humor e eu cheguei com um trabalho sério, critico. Quase não foi exposto e até hoje me orgulho por ter um revisionismo histórico ali, mostrando chacinas, extermínio e tudo de ruim que houve na colonização.


E a HQ Zombie Night, uma homenagem ao mestre George Romero (1940-2017) ?

VO - Originalmente eu tinha feito apenas para protestar contra os mortos velocistas que tem aparecido no cinema, e homenageando o mestre Romero e as convenções que ele criou no gênero. Acabou que ela foi incluída na segunda edição da revista Boca do Inferno, juntamente com uma pintura minha com zumbis, uma releitura do quadro American Gothic, do Grant Wood, que eu tinha feito nos tempos da UFBA. Acabei participando de mais duas edições da publicação.

Tem também as novas aventuras de Lord Jesus. Como foi o processo de criação desse personagem e foi publicado em que ano?

VO - Essa HQ, infelizmente só publiquei online em 2008. Pretendo até refazê-la e dar continuidade. Foi algo que pensei na faculdade. Que do jeito que as coisas estão, as mensagens de paz de Jesus não seriam ouvidas e ele precisaria sofrer um upgrade, se atualizar. Foi algo feito de zoeira, mas rendeu boas risadas.

Você tem uma HQ feita em parceria com Hector Salas, A Mulher de Minha Vida. Conte um pouco como foi feita?

VO - Essa HQ foi feita para o Salão de Quadrinhos do SESI de São Paulo (2006). Queríamos fazer algo de impacto, pintada e com poucas cores. Na verdade, a grande maioria das HQs que eu fiz em parceria, publicadas ou não, foi com o Hector, que é um grande amigo.


Você ilustrou a nona edição de Raio Negro, de Gedeone Malagola para a Editora Júpiter II. Como foi esse trabalho?

VO - Após a publicação da HQ Zombie Night, o editor da Boca do Inferno, que também editava a revista do Raio Negro, me contatou com roteiros originais do Gedeone, que ele tinha escrito antes de falecer, e eu topei na hora. Fiz no meu estilo, mas respeitando a simplicidade do material original. Tenho muito orgulho da HQ, mas olhando hoje, eu não curto muito a capa que eu fiz.


Você também fez ilustração para capa de diversas bandas. Poderia citá-las?

VO - Sim, fiz a capa de algumas bandas, entre elas a Inside Hatred, de Ilhéus, Mercy Killing de Curitiba; e de Salvador tem as capas para a Animus Necandi, Knightrider, RATTLE, Trepanator e para a banda russa Hell´s Thrash Horsemen.

Como foi sua participação no final dos anos 80 da AQB (Associação de Quadrinistas da Bahia), grupo de fanzineiros...

VO - Conheci os caras por acaso, e tenho amizade com a maioria até hoje.  Cheguei la conversando sobre HQ e fui mostrando o que eu fazia, ainda com caneta. Ai os caras foram me mostrando outras formas de fazer quadrinhos. Participei das reuniões e fiz alguns projetos, mas o grupo começou a dispersar pouco depois.

Você publicou quadrinhos na revista Crau, Impression, quadrinhos eróticos pela 2M (Brazil e HQ Brazil), e no núcleo de pesquisa da UFBA. Conte essa trajetória

VO - A Crau foi conquista de Hector Salas, e todos os contatos que ele fez. Após uma mini revista, fechamos para a Crau, mas a experiência não foi boa, pois o editor refez paginas e adulterou desenho e ainda censurou artes e adicionou material de uns caras de São Paulo sem nos consultar. Posteriormente o editor foi para a 2M, que publicava umas revistas de sacanagem e que saia nacionalmente. Ai eu e Hector topamos a empreitada e mandamos alguns trabalhos que foram bem aceitos, sendo que apenas um foi pedido para modificar o final. Foi um período bacana, eu trabalhando, saia do trampo, ia pra casa do Hector desenhar tudo, para ele pintar na mão com aquarela e guache, e mandar o mais rápido possível. Apenas a ultima produção, uma HQ mais longa, tivemos um tempo mais flexível, e por isso Hector pintou tudo no computador. O resultado foi muito bom. No núcleo de pesquisa apenas um fanzine foi produzido. Infelizmente, rola muita politicagem e gente querendo ver seu projeto naufragar, e muito indo contra você.


E a experiência de participar de vários salões de humor nacionais e internacionais.
VO - Embora eu prefira fazer historias em quadrinhos, participei de alguns salões. Não me acho tão bom e criativo com cartuns e charges, mas foi gratificante participar e ter o trabalho reconhecido.

Enquanto criador, o que os quadrinhos são para você?

VO - Um meio de por idéias no papel, dar vida a personagens e criar imagens impactantes.

O que você alcançou com seus quadrinhos, e aonde você pretende chegar?

VO -Os quadrinhos me ajudaram a escolher a profissão que exerço, como professor de arte e Historia da Arte, e influencia minhas escolhas. Gostaria muito de viver deles, mas a realidade é complicada, para não dizer injusta (risos).

Qual seria o caminho para a produção brasileira conquistar o devido espaço e o merecido reconhecimento?

VO - Temos excelentes autores, material de qualidade sendo publicado. O que falta mesmo é o interesse por parte do público consumidor. Esmagadora maioria ainda acha que quadrinho nacional não tem qualidade. Também falta incentivo, apoio, patrocínio e divulgação.


Fale um pouco de você como musico e videomaker.

VO - Eu sou vocal de uma banda. Toco por diversão, embora leve a sério o que faço. Somando tudo que eu já produzi com todas as bandas que montei, tenho duas demos, 1 split cd (dividido com outra banda) lançado aqui e na Russia, uma participação em coletânea e um cd lançado nacionalmente e vendido até fora do Brasil. Na parte de produção visual, fiz alguns curtas, mas hoje em dia me dedico a produzir mostras de filme, e sou o criador/curador da Mostra de Cinema Cine Horror, que já está indo para a terceira edição anual, mas que tem exibições mensais. A mostra anual tem foco na produção nacional de cinema de gênero fantástico (terror, suspense, thrillers, ficção cientifica), e fora material brasileiro, já exibimos material de produções portuguesas, Italianas, Espanhola e americanas.

Você utiliza muito a ferramenta da internet no desenho digital?

VO - Única coisa que faço digitalmente são correções e efeitos. Prefiro o desenho à mão livre. Já a internet é um local onde tenho divulgado meus trabalhos. Sejam ilustrações ou quadrinhos.


E seus projetos futuro?

VO - Estou planejando uma exposição para maio de 2018, na galeria Pierre Verger, no subsolo da Biblioteca Central dos Barris, com ilustrações minhas e de amigos, como Hector Salas, Sidney Falcão, etc, homenageando os 20 anos da Turma do Xaxado, do saudoso mestre Antonio Cedraz. E pretendo correr atrás para lançar a segunda edição da revista em quadrinho Área 71. Fora isso ainda tem a Mostra de Cinema Cine Horror.

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