13 maio 2009

Leve, ágil, cortante e irreverente traço de Lage (3)

Outro veterano, o desenhista Valtério foi mais longe. “Pela criatividade, starte visão de mundo que ele tinha, Lage estava entre os dez melhores cartunistas do Brasil, incluindo ai nomes como Ziraldo e Paulo Caruso. Ele apenas teve menos visibilidade. Além de tudo, era uma pessoa boa, essa doença foi uma brutalidade”, declarou. Valtério, que se refere ao artista como “amigo-irmão” esteve ao lado de Lage na fundação da Galeria do Humor, que funcionou na Boca do Rio entre as décadas de 80 e 90, e na criação da revista Pau de Sebo, junto com o também cartunista Paulo Setúbal. “Eu o conheci por volta do ano de 1975, quando comecei a trabalhar no Jornal da Bahia, antes de trabalhar com ele já o admirava muito. A gente desenvolveu um lado muito afetivo. Ele era muito generoso, como profissional tinha o seu humor próprio, um humor de alta qualidade. O que fica dele é a imagem de um cara bem humorado e criativo”, definiu Paulo Setúbal. Para ele, Lage sempre teve um humor diferenciado e muito pessoal. “Enquanto todo mundo fazia o convencional, ele conseguia colocar umas pitadas de baianidade. No Brasil, poucos fazem charge como ele fazia”.

A publicação serviria de inspiração para uma nova geração de artistas baianos. “Quando comecei profissionalmente, ele já tinha 20 anos de estrada. Eu comprava a revista Pau de Sebo só para ver seus desenhos que tinham um estilo marcante, tanto pelo traço quanto pelo tom politizado, além deterem um timming maravilhoso”, disse Flávio Luiz, ilustrador na época do Correio da Bahia

“Tive poucas oportunidades de estar com ele, mas o admirava porque ele combatia o autoritarismo fazendo críticas contundentes sem nunca perder a veia do humor. Infelizmente, não há outro que possa ser posto no lugar. E a Bahia vai perdendo a graça”, disse Cau Gómez.
“Eu fui amigo de Lage desde meninote, no colégio Maristas, na década de 50, companheiro de sala, já então um grande desenhista. E a vida sempre nos deixou juntos: no lançamento da Tribuna da Bahia, em 69, sob o comando de Quintino de Carvalho, onde ficou até o fim, na sucursal do Jornal do Brasil, na década de setenta, onde foi um dos cartunistas, e, no fim, na Coopercom, uma cooperativa de profissionais de comunicação, onde fizemos juntos a revista Viver Bahia e o Jornal do Metrô até 2005 e estreitamos a nossa amizade. O Jornal do Metrô era um projeto nosso. Com a doença de Lage, o projeto ficou suspenso e, sem ele, extinto. Ele nunca assumiu a sua dimensão. Quando trabalhou no Jornal do Brasil, tinha tudo para ser um nome nacional. Não quis. Ele gostava mesmo era de sua vida simples ao lado de Marta, sua esposa, e Daniel, o filho”, declarou o jornalista Osvaldo Gomes.
O diretor-presidente da Tribuna da Bahia, Walter Pinheiro, disse que Lage tinha sido um ótimo filho, esposo e um pai generoso, extremado e invejável colega de trabalho como poucos chargistas sabia se manifestar diante das agruras da vida, das injustiças e da desumanidade. A Tribuna da Bahia, sem dúvida, cresceu tendo uma das suas grandes estrelas. Com a sensibilidade do artista, de sua pena para comunicar-se com todos os seus leitores e admiradores, transmitindo as suas críticas, os seus protestos, as suas reflexões, através do amor. Como todo gênio, seu trabalho permanecerá para sempre, porque um gênio não morre nunca”. A história do cartunista é considerada a própria história da Tribuna da Bahia para o diretor de redação do jornal, Paulo Roberto Sampaio, “marcante por seu talento, independente e de muita criatividade”.
ÂNSIA DE AMAR O TRAÇO
“Para quem não o conheceu, vou me atrever a apresentar. Era o cara das tirinhas Ânsia de amar e desenhos de ironia finíssima que valiam tanto quanto os editoriais. Lage mexia também com a política, e nem sempre agradava ao pessoal que gostava do poder. Cabeça baixa, risinho de canto de boca, quando a gente menos esperava, lá vinha um desenho reinventando uma cena do cotidiano, um relance de uma situação inusitada. Ele nem tinha e nem precisava desses aparatos techno das telas de 200 mil cores de hoje. Bastavam um pedacinho de papel e tinta preta, que ele derramava com uma humanidade rimada de simplicidade. Neste mundo de aparência, foi-se um exemplar de gente que não curtia alarde (...) Ele foi antes, mas todo mundo vai um dia. Tanto talento, é claro, nem sempre foi reconhecido como deveria pelos baianos (...) Nestes tempos difíceis de digerir, pois os talentos são engolidos como mercadorias, a lembrança de Lage vai ficar como a de um cara que tem mesmo a ânsia de amar o traço como gênero jornalístico muitas vezes superior aos melhores textos” (Paulo Roberto Leandro, jornalista – “Esse Lage é engraçado!”. A Tarde, 01/12/2006).

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